Metade dos jovens que saíram da escola na pandemia foi trabalhar
Um em cada dez jovens entre 11 e 19 anos abandonou os estudos durante a pandemia de Covid-19 e não retornou para a escola. O principal motivo para terem deixado de estudar, apontado por 48% deles, foi a necessidade de trabalhar.
Os dados são de um estudo feito pelo Ipec, a pedido do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), e foram divulgados nesta quinta-feira (15). Foram entrevistados, pessoalmente, 1.100 jovens dessa faixa etária em todas as regiões do país entre os dias 9 e 18 de agosto.
O percentual de jovens que não estão frequentando a escola representa cerca de 2 milhões de adolescentes em todo o país. Os responsáveis pelo estudo destacam que esse número deve ser ainda maior, já que a pesquisa não incluiu crianças de até 10 anos.
A maior parte dos que saíram da escola (65%) deixou os estudos antes mesmo de chegar ao ensino médio. O 9º ano do ensino fundamental é a série com o maior percentual de evasão (16%), segundo os resultados do estudo.
Mônica Dias Pinto, chefe de educação do Unicef no Brasil, destaca que os resultados mostram que a evasão escolar é resultado direto da desigualdade socioeconômica do país. No geral, 11% dos entrevistados não estão na escola, mas entre aqueles que são de famílias da classe AB esse percentual cai para 4% e sobe para 17% na classe D/E.
“É um problema que surge da desigualdade social e a perpetua. Sem garantir o direito à educação a esses jovens, eles estarão mais propensos a continuar vivendo em condições menos favoráveis”, diz Mônica.
Ter que parar de estudar para ajudar no sustento de casa é uma história que se repete na casa do mecânico Vanderley Deloste, 52. Ele estudou até o 5º ano, mas parou para ir trabalhar. No ano passado, ele viu o filho Vitor Hugo com 16 anos também ter de deixar a escola no 1º ano do ensino médio.
“Eu e a mãe dele ficamos sem serviço por muitos meses e a situação estava difícil em casa. Então, ele teve que ajudar, começou a fazer uns bicos na oficina mecânica e outros em trabalho de alvenaria”, conta Deloste.
Ele afirma que o filho era um estudante exemplar, sempre com boas notas e que adorava estudar matemática. “O que ele mais quer é voltar pra escola. Eu também, porque sei que é o único jeito de ter um futuro melhor. Mas agora não tem como, ele precisa trabalhar pra ajudar em casa.”
Vitor estudava em uma escola estadual na região do Parque de Taipas, no extremo da zona norte de São Paulo. A direção da unidade ligou três vezes para a família pedindo para que o menino voltasse.
O adolescente conta que quer voltar para a escola no próximo ano e planeja entrar em uma turma de EJA (Educação de Jovens e Adultos) para não atrasar ainda mais os estudos, já que quer fazer faculdade de economia.
“Eu fico preocupado de ter parado os estudos, de nunca mais conseguir outro emprego. Quero voltar a estudar porque gosto, mas também porque sinto falta dos meus amigos”, afirma.
Desde que saiu da escola, ele perdeu o contato com a maioria dos colegas de turma já que trabalha das 7h às 18h e também aos sábados. “Tenho saudade de encontrar meus amigos todo dia na escola.”
Segundo a pesquisa do Ipec, depois da necessidade de trabalhar, o segundo motivo mais apontado pelos jovens que saíram da escola foi não conseguir acompanhar as atividades (30%) e porque as aulas presenciais ainda não tinham sido retomadas (29%).
“Nesses outros dois motivos, a desigualdade também está presente. Os alunos mais pobres tiveram menos condições de estudar durante a pandemia, porque não tinham acesso a internet e equipamentos. Ou seja, tiveram mais prejuízos de aprendizado”, diz Mônica.
Estudos já mostraram que escolas em regiões mais pobres foram as que mais demoraram a retomar as atividades presenciais.
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